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  • 02/05/2017
    Crítica da ópera Norma, de Bellini


    Ontem à tarde, o Theatro Municipal do Rio, voltou aos seus tempos de grande esplendor. A preços populares, o teatro ficou completamente lotado. Muita gente voltou por falta de ingressos. Que alegria. Há muitos anos não via uma plateia assim. A grande maioria era de jovens, gente que nunca havia assistido uma ópera e, maravilha das maravilhas, comportaram-se com uma dignidade impressionante. Aplaudiram freneticamente, um espetáculo, que apesar de ter sido levado em forma de concerto, conquistou a todos, principalmente pela sua grande qualidade vocal e musical.
    Frequentador há muitos anos das nossas temporadas, fui conduzido novamente ao auge da ópera nacional, na década de 60 do século passado. Nossos artistas líricos faziam uma cooperativa e montavam temporadas memoráveis. Casas lotadas a preços populares. Sucessos retumbantes.

    A ópera vive, respira através dos seus intérpretes e do público. Acho que ontem, reencontramos este caminho. Bravos, muitos bravos a todos. Ao André Heller por sua iniciativa, aos corpos estáveis e aos funcionários pela dedicação e empenho. A arte vence todas as crises e Norma foi fulminante. Esquecemo-nos das agruras e dos percalços injustos, aos que os funcionários estão submetidos. A falta dos salários, as incertezas do dia a dia. A falta do dinheiro para condução, para o pão de cada dia, do aluguel, para cuidar da saúde e instrução dos filhos. A situação é desesperadora e ninguém dá fim a este suplício. Mas eles nos dão uma lição de vida. Trabalham expostos a terrível humilhação, de esperar por doações, para as suas sobrevivências...

    Norma é uma ópera em dois atos, composta por Vincenzo Bellini, com libreto de Felice Romani, baseada na tragédia Norma ou l'Infanticídio Louis-Alexandre Soumet (1786-1845).
    Composta em menos de três meses, em 1831, estreou no Teatro alla Scala em Milão em 26 de dezembro do mesmo ano, inaugurando a temporada de carnaval e a Quaresma 1832 .
    A história se passa na Gália no tempo da Roma antiga, e tem uma ligação explícita com o mito de Medéia.
     

     

    Personagens e elenco:
    Norma, alta sacerdotisa: Elizabeth Blancke-Biggs -Soprano
    Adalgisa, sacerdotisa: Beatriz Simões* (dia 1º) – Mezzosoprano e
    Denise de Freitas (dias 4 e 6) – Mezzosoprano.
    Pollione, pró-cônsul romano na Gália: Eric Herrero - Tenor
    Oroveso, chefe druida: Pepes do Valle - Baixo
    Clotilde, amiga e confidente de Norma: Noeli Mello* - Soprano
    Flávio, centurião romano e companheiro de Pollione: Ivan Jorgensen* - Tenor

    * Artistas do Coro do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

    Assistente de direção musical: Priscila Bomfim.

    Coro e Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
    Direção musical e Regência: Maestro Roberto Tibiriçá.


    Lauro Gomes e Elizabeth Blancke-Biggs após o espetáculo

    1º Ato:
    Norma, em segredo, ama e tem dois filhos com um inimigo, Pollione.
    Pollione confidencia a seu amigo Flavio que agora ama uma jovem noviça do Templo Irminsul, Adalgisa. Adalgisa abre seu coração com Norma e confessa que ela errou em votar a castidade, sem revelar o nome do seu amado. Norma, reconhece o seu próprio drama, pecado e a traição aos seus votos. Então ela pergunta quem é o amante e Adalgisa indica Pollione, que que se aproxima no momento e fica furioso. Norma revela tudo a Adalgisa, que indignada rejeita Pollione


    2º ato:

    Norma, chocada com a revelação, decidiu matar os dois filhos, mas sucumbe ao sentimento materno. Determinada a matar-se, chama Adalgisa e pede-lhe para levar as crianças consigo para Roma, depois de se casar com Pollione. Mas Adalgisa se recusa e promete persuadir Pollione a voltar para ela.
    Os druidas, liderados por Oroveso, tramam uma revolta contra Roma. Norma, que sempre se opôs, descobre que Adalgisa não conseguiu dissuadir Pollione, chama os gauleses e proclama guerra contra os romanos. Para a cerimônia, tem que pronunciar o nome da vítima que será sacrificada ao deus. Um romano ousou penetrar no claustro: Pollione, veio para sequestrar Adalgisa. Norma está prestes a atingi-lo com um punhal, mas depois arrepende-se, convida a todos para sair com o pretexto de interrogá-lo e, a sós com Pollione, oferece-lhe a vida, desde que ele abandone Adalgisa. Pollione se recusa e Norma convoca o seu povo para a celebração. Ela decidiu que quem vai ser a vítima: será uma sacerdotisa que quebrou os votos sagrados e traiu seu país. Quando vai pronunciar o nome de Adalgisa, percebe que a culpada é ela e, com espanto geral, pronuncia o seu próprio nome. Comovido, Pollione percebe a grandeza de Norma e decide morrer com ela. Norma implora a Oroveso para ele cuidar das crianças, e segue para a fogueira com o homem a quem ama.

    O espetáculo:
    A montagem é bem simples. Tablados em degraus e cadeiras para o coro e uma iluminação convencional, com focos para os personagens principais.

    Ivan Jorgensen – viveu um Flávio bem compenetrado. Voz segura e bem projetada. Provou que pequenos papeis, podem revelar grandes talentos. Perfeito na sua postura e musicalidade.

    Noeli Mello – deu vida a uma Clotilde intensa e bem articulada. Bela voz e estimulante presença cênica. Poderá ser muito bem aproveitada em papeis maiores. Autoconfiança e determinação não lhe faltam.

    Pepes do Valle – um Oroveso bem resolvido. Graças a sua experiência de palco começou o Ite sul colle, o Druidi, com um pouco de nervosismo natural para uma estreia, mas logo se impôs com Sì. Parlerà terribile, dando-nos um comovente embate com a filha no final.

    Beatriz Simões – uma Adalgisa espetacular. Não me lembro, nos últimos tempos, de uma revelação tão gloriosa como esta. Foi sublime, uma sacerdotisa ideal. Começando com a sua ária, Va crudele, assombrando a todos. Graves, agudos, voz linda e igual, foi uma apoteose. Logo em seguida com o dueto com Pollione, Vieni in Roma. Aplausos intensos. O dueto com Norma, Sola, furtiva al tempio, seguido pelo trio (mais Pollione) - Oh! di qual sei tu vittima, soaram perfeito. Três gigantes em cena. No segundo ato, o dueto, Mira, o Norma, foi uma lição de bel canto seguido da espetacular cabaleta - Si fino all'ore estreme, compagna tua m'avrai – com vocalizes e afinações perfeitas, consagraram a participação desta grande artista que nasceu nesta Norma, e parte para a Alemanha na sua luta para conquistar o mundo. Deus está com ela. Bravos.

     


    Lauro Gomes com a grande revelação: Beatriz Simões

    Eric Herrero, grande revelação na Jenufa, tem tudo para ser um Pollione ideal. Material vocal potente e musicalidade sensível. Fez um bom trabalho, cheio de méritos, mas faltou mais valentia na sua empreitada. Foi um pouco tímido, pareceu receoso em ousar mais. O Pollione é um guerreiro em todos os sentidos. Estreia é estreia e Eric vai se afirmar a partir do 2º espetáculo, tenho certeza. Ele começou bem, sua perigosíssima ária - Meco all'altar di Venere – saiu-se com bravura, agudos seguros, assim como a cabaleta em sequência - Me protegge, me difende, foi inspirada. Depois ele optou por uma linha mais lírica e menos desgastante. Foi sóbrio e elegante e cumpriu o seu papel com grande profissionalismo. Bravos mas queremos mais.

    Elizabeth Blancke-Biggs, é uma diva nata. Uma estrela em todos os sentidos. Foi uma Norma transbordante. Cheia ímpeto e ferocidade. Facilidade vocal, agudos em pianíssimos absurdos, graves em consistência admirável, e sobretudo, escola e estilo. Sua Casta Diva, seguida da cabaleta - Ah! Bello a me retorna, conquistaram o público. Depois foi só uma sucessão acertos: o 1º dueto com Adalgisa e o seu momento no trio – Oh! Não tremar, o perfido, por lei.- foram únicos. No começo do 2º ato, suas contradições no recitativo – Dormono entrabi, seguido da ária - Teneri figli, foram fulgurantes. Que grande intérprete. Do dueto Mira, o Norma, já mencionado, passamos para o final. Sua confidência: Ei tornerà Si, mia fidanza è posta – desencadeou o final emocionante: Dueto com Pollione: In mia man alfin tu sei – e revelação - All'ira vostra nuova vittima io svelo – o outro duo com Pollione - Qual cor tradisti, qual cor perdesti – Encaminharam para o triste final com - Deh! Non volerli vittime, fizeram que Elizabeth recebesse uma ovação digna ao seu magnífico desempenho. Bravíssima!

    O Coro do Theatro Municipal, como sempre, foi soberano: Dell'aura tua profética - Norma viene: le cinge la chioma – seguido da Casta diva. No 2º ato: No partì, finora è al campo - Guai per Roma allor che il segno – mostraram intrépidos guerreiros gauleses que se condoem no final - Vanne al rogo ed il tuo scempio. Um trabalho muito elaborado por Jésus Figueiredo.

    A Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal, tão ou mais guerreira do que os gauleses. Deu exemplo de dedicação extrema. Muito bem conduzida pelo Maestro Roberto Tibiriçá, com momentos de requintes e sabendo respeitar os andamentos dos diversos artistas envolvidos. Memorável apresentação.

    Esperamos que André Heller, continue inspirado na condução artística do Theatro. Meus parabéns efusivos por mais esta grande vitória. E vamos em frente.

    Se vocês gostam de música, de teatro e canto, o momento é este. Norma é um espetáculo que enobrece o nosso panorama artístico. Todos têm o dever de sair de casa e apoiar os nossos grandes artistas. Aposto que todos vão adorar.


    Norma carinhosa. Fantástica.

     

     

     



     


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