16/10/2016
Crítica do Concerto de Nelson Freire
no Municipal do Rio
crítica da apresentação do pianista
Nelson Freire em concerto com a Orquestra Tonhalle de Zurique, sob a regencia de Lionel Bringuier no
Theatro Municipal do Rio de Janeiro
Ontem à noite, o Theatro Municipal,
vivenciou um dos momentos mais
gloriosos da sua existência. No
pódio, Lionel Bringuier, conduziu de
forma brilhante, dominando toda a
dinâmica do concerto, com entusiasmo
de um jovem adolescente, a
fantástica Orquestra Tonhalle, de
Zurique. E somado a isto, um
espantoso Nelson Freire, no auge da
sua autoridade artística, levando a
plateia ao delírio.
Graças a sua maturidade apurada,
profundidade interpretativa e
programação distinta, rapidamente, o
ainda jovem maestro francês Lionel
Bringuier, estabeleceu-se como um
dos condutores mais atraentes da sua
geração. Ele rege frequentemente
famosas orquestras com grande
sucesso, levando-o a ser nomeado
Maestro Principal e Director Musical
da Tonhalle Orchestra de Zurique, em
2012. Entrando na quinta temporada
desde a sua estreia momento decisivo
com a Tonhalle, visão ousada do
Bringuier e idade ilimitada de
energia - tanto dentro como fora do
pódio - está respirando nova vida e
vitalidade em um conjunto histórico.
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Nelson Freire e Lauro Gomes após o
concerto
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Começando o espetáculo, a Abertura
da Ópera La Gazza Ladra, de Rossini,
estreada no Teatro alla Scala de
Milão, no dia 13 de maior de 1817.
Uma das mais luminosas e cintilantes
aberturas do compositor, famosa
principalmente pelo inusitado uso de
taróis (caixas), na partitura.
Precisão, punho firme e o peso de um
trabalho meticuloso, a orquestra
soou soberana, numa interpretação
sem deslizes, com ímpeto e vigor.
O público foi conquistado de
imediato, respondeu com vivos
aplausos, mostrando estar atento e
devidamente preparado para o grande
momento da noite:o Concerto para
Piano e Orquestra, em Lá menor Op
54, de Schumann
Movs: Allegro affettuoso.
Intermezzo: Andantino gracioso
Finale: Allegro vivace.
Em 1841, Schumann compôs uma
Fantasia, para piano e orquestra.
Graças aos insistentes pedidos da
sua esposa, a notável pianista Clara
Schumann, quatro anos após, ele
acrescentou dois movimentos a sua
fantasia, formando assim o concerto
que foi estreado em Leipzig, em 1º
de janeiro de 1846, na interpretação
da Clara.
O primeiro movimento um expansivo, "Allegro
affettuoso", reflete de perto o
inicial de uma fantasia para piano,
um tema de abertura ferozmente
poderoso é contrastado com um lírico
dueto piano e clarinete, fornecendo
elegante contraste entre os dois
modos divergentes. O segundo
movimento, um doce "Intermezzo",
lembra uma cena de felicidade
doméstica tranquila. Sem pausa, a
peça se move para o movimento final,
"Allegro vivace", reafirmando temas
anteriores e concluindo com um final
vibrante.
O pianista Nelson Freire foi
aclamado pela crítica internacional
como um dos maiores pianistas do
século XX. Aos 72 anos, sua carreira
já dura 68, pois realizou seu
primeiro recital público com apenas
5 anos de idade, despertando o
interesse da imprensa da época, que
não tardou a chamá-lo de "prodígio".
No concerto, Nelson demonstrou mais
um vez o seu impressionante talento
e, o mais importante, a sua música,
a sua arte. Com seu toque lírico e
fraseado impecável, ele centrou-se
muito mais no íntimo da obra,
dando-nos uma versão romântica,
melodiosa, sem arroubos melosos.
Maturidade, consciência
interpretativa, integração
constante, suave, quase íntima entre
solista e orquestra e sua atuação
conjunta para o prazer, de quem
assistiu inebriado a performance do
pianista. Uma interpretação
definitiva. A plateia foi ao êxtase
e explodiu em ovações. Nelson com
muitos compromissos seguidos pela
frente, foi econômico, deu apenas
um extra: A Dança dos Espíritos
Abençoados, da ópera Orfeu e
Eurídice, de Gluck. Inimaginável os
contrastes sonoros alcançados por
Nelson. Foi como chuva de fluidos
celestiais, aspergidos sobre nós,
pobres mortais.
Na segunda parte do concerto, um
show à parte da Tonhalle Orchestra.
A Sinfonia n 1, em Ré Maior, foi
composta por Gustav Mahler, entre
1881 e 1890, estreando no dia 20 de
novembro de 1894 em Budapeste, sob a
condução do próprio Mahler.
Esta obra é uma sinfonia primaveril,
parecida em alguns aspectos, com a
Sinfonia 1, “Primavera”, de Robert
Schumann. Ela não é contudo uma
simples descrição visual da
natureza. Ela reflete uma natureza
sob os inocentes olhos de uma
criança, que ao mesmo tempo toma
consciência da fragilidade e da
morbidez inerentes à condição
humana.
Na sua forma final a sinfonia, é
formada por quatro movimentos
distribuídos da seguinte forma:
Langsam, schleppend - Devagar,
arrastando.
Scherzo, Kraeftig bewegt -
Poderosamente agitado.
Feierlich und gemessen, ohne zu
schleppen - Solene e moderado, sem
se arrastar.
Stuermisch bewegt – Agitado.
Sonoridade, amplitude, estudos e a
dedicação constante, fizeram da
orquestra, sob as mãos mágicas do
seu regente, chegar aos píncaros da
sua busca através do sublime.
Impecável apresentação, devidamente
consagrada por um público ávido de
arte e emoções.
Lotadíssimo, o Theatro Municipal,
viveu momentos especiais na noite de
ontem.
Num período de crises e contenções,
como o que vivemos, a Dell’Arte e
Myrian Dauelsberg, conseguiram o
milagre, de bancar a presença desta
orquestra colossal. Forças e ânimo
pra vocês. Bravos pela audácia e a
coragem, impossível pedir mais.
Triunfo total e absoluto.
Lauro Gomes
e o Maestro Lionel Bringuier.
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